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Afetividade na Educação Infantil: a importância do afeto para o processo de aprendizagem



Falar, andar, comer alimentos sólidos, brincar com outras crianças, ir para a escola e ali aprender milhares de coisas… Os adultos ficam ansiosos para essas etapas, mas você já parou para pensar que antes disso tudo acontecer as crianças já estão descobrindo e aprendendo a lidar com diversos sentimentos e emoções? Pensando nisso, o professor não pode ignorar que seus educandos, assim como ele, são seres que quando tratados com afeto têm mais chance de se desenvolver emocional e intelectualmente.

A primeira infância, de 0 aos 5 anos, é o período em que os seres humanos constroem suas bases cognitiva, emocional, motora, social e ética. Quando ainda não sabem utilizar a linguagem oral, as crianças fazem uso principalmente da emoção para se comunicar com o mundo, através do choro e sorriso, por exemplo. Ao adquirir a fala, as crianças ganham mais um meio de expressar o que sentem e começam a se relacionar com o mundo de outra forma. Segundo o pensador Jean Piaget, o desenvolvimento intelectual em dois componentes: o cognitivo e o afetivo, que caminham juntos. Para ele, toda ação e pensamento são ações cognitivas, representadas pelas estruturas mentais, e afetivas, representadas por uma estrutura energética, que é a afetividade.

“Quando a relação afetiva entre o professor e sua turma é positiva, as crianças desenvolvem melhor sua memória, autoestima, vontade e pensamento”, afirma Tágides Renata Mello, coordenadora da Educação Infantil da Escola Educare e professora do Centro Universitário de São Roque. “Esses aspectos influenciam o desenvolvimento cognitivo, pois é preciso ter vontade, estar confortável e feliz no ambiente escolar para de fato querer estudar. Não há aprendizado sem afetividade”. Em seu papel de coordenadora, ela percebe que as crianças estão “crescendo com uma excelente formação pedagógica”, mas que muitas escolas deixam de lado a questão emocional envolvida no processo de formação. “Os alunos não sabem interagir, dividir brinquedos, ouvir nãos, esperar sua vez, lidar com suas emoções. Mas uma criança que desde pequena é ouvida, observada e valorizada vai ser mais autônoma, crítica e segura em relação ao que pensa”, afirma Tágides. “Nesse sentido, trabalhar com as habilidades socioemocionais é muito importante, mas não pode se restringir a uma disciplina específica”.


Demonstrando afetividade

Há quem acredite que para ser afetivo é preciso abraçar e beijar os alunos. Algumas crianças chegam a passar 12 horas por dia na escola e ficar todo esse tempo sem receber um abraço não é bom, mas essa não é a única forma de demonstrar afeto. Promover uma roda de conversa no início da aula e ouvir com atenção os alunos contarem o que fizeram em casa, sentar ao lado deles enquanto desenham e perguntar a respeito, contar uma história enquanto troca a fralda, acompanhar as brincadeiras e observar o que estão falando entre si são formas pelas quais o professor pode demonstrar carinho, atenção e cuidado pela sua turma. “A relação afetiva com a criança não tem momento certo. Ela vai acontecer durante toda a rotina, em todos os momentos, na observação, na atenção dada ao que a criança diz e no respondê-la bem”, explica Tágides Mello.


Limites do afeto com a criança (pensando na família)

É importante lembrar que por mais que o vínculo afetivo entre educadores e educandos seja essencial, ele deve estar centrado na aprendizagem. “A criança precisa entender que estar com seu professor não é como estar com sua mãe, seu pai, irmãos, tios”, afirma Maria Cristina Mantovanini, doutora em Psicologia da Educação pela Universidade de São Paulo e psicanalista membro associada da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo. Segundo ela, o elo precisa ser desenvolvido entre eles. “O professor respeita a criança, leva desafios adequados para sua faixa etária, não impõe disciplina pelo medo, proporciona momentos agradáveis em sala de aula e ensina coisas interessantes”, diz.

No que diz respeito a contatos físicos, o limite é em relação ao respeito à criança, e na abertura que ela ao professor – ou não. “Há crianças que são mais afetivas, chegam na escola e já correm para abraçar o professor. Outras não gostam disso, ficam bravas e até esfregam o rosto depois de receber um beijo. É preciso observar e respeitar cada comportamento e criar diferentes modos de demonstrar que se importa com cada um”, diz Tágides Mello. A coordenadora lembra também que alguns pais não gostam dessa proximidade entre seu filho e o professor. Algumas famílias têm modos diferentes de expressar sentimentos e essa questão também deve ser levada em conta pela escola.


Desenvolvimento emocional, social e intelectual

Quem não tem ou ao menos se lembra com carinho de um amigo de infância? As relações construídas na escola ajudam a criança a se desenvolver emocional, social e até mesmo intelectualmente, uma vez que crianças também podem ensinar muito umas às outras, além de se sentirem seguras e gostarem de frequentar a escola. Entretanto, assim como acontece entre os adultos, a relação entre elas nem sempre é harmoniosa. “O ‘simples’ fato de estar na escola já exige muitas habilidades socioemocionais: aprender a dividir a atenção, saber que ninguém é protagonista, esperar a sua vez, dividir brinquedos, controlar o quanto e o que se fala. Nem sempre isso se aprende em casa e a escola é lugar legítimo de desenvolver esse convívio”, comenta a psicóloga Maria Cristina.

A primeira referência do professor deve ser o grupo: aprender como lidar com aquela turma e os sentimentos gerais, organizar rodas de conversa para que todos possam expressar o que sentem, identificar conflitos, observar o vocabulário utilizado entre os alunos e incentivar o diálogo, a empatia e a cooperação entre todos. Em alguns casos, é preciso partir para o individual e chamar alguma criança para conversar em particular, independentemente da idade. “Quando a criança está com dificuldades para se relacionar com seus pares, ela pode criar diferentes estratégias para mostrar isso: se isola, não participa, chama atenção pelo comportamento indisciplinado ou vira o ‘palhaço’ da turma para se fazer presente”, explica Maria Cristina. Ela afirma que o professor precisa mostrar que percebeu o que está acontecendo e que está preocupado com a criança. “Geralmente, a conversa com a criança e com a turma resolve a questão, mas quando isso não acontece é preciso procurar a família, que é aliada da escola no desenvolvimento afetivo e social das crianças”, enfatiza.


Sentimentos podem ajudar ou atrapalhar desenvolvimento

Nem todos os cursos de pedagogia e licenciatura têm disciplinas voltadas para as diferentes demonstrações emotivas que podem surgir em uma sala de aula. Mas estando o professor preparado ou não, ele terá à sua frente uma turma repleta de sentimentos, que podem ser trabalhados de modo a desenvolver ou atrapalhar seu desenvolvimento cognitivo.

Existem diversos pensadores, livros, vídeos e outros materiais que podem ajudar os professores a ensinar levando em consideração o afeto (veja a lista abaixo), mas o mais importante é que sua formação humana esteja adequada ao trabalho com crianças. “O professor que se coloca no lugar de seu aluno, que aceita os desafios que a profissão oferece, que tem um olhar diferenciado para a criança, que sabe a hora certa de comunicar pais e coordenação sobre eventuais problemas, que ouve a criança, que não oprime ninguém, que respeita ao próximo, esse sim é um profissional que faz a diferença em uma escola”, cita a coordenadora Tágides Mello. “Afetividade é afetar o meu próximo, então é preciso se perguntar: como eu, professor, estou afetando meus alunos?”.


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